V Congreso de Antropologia Social

La Plata - Argentina

Julio-Agosto 1997

Ponencias publicadas por el Equipo NAyA
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Estrategias Indígenas face ? implantação de barragens em seus territórios: estudo dos Kaingang e Guarani da Bacia do Rio Tibagi, Pr., Brasil:.

V§ CONGRESO ARGENTINO DE ANTROPOLOGIA SOCIAL" LO LOCAL Y LO GLOBAL. LA ANTROPOLOGIA SOCIAL ANTE UN MUNDO EN TRANSICION".
Comisión de Trabajo" Problemas socioambientales, movimientos poblacionales y relocalizaciones".
Coordenadora" Dr¦.Maria Rosa Catullo.
Universidad Nacional de La Plata, La Plata, Argentina, 29.07 al 1§. 08. 1997.

Autora" Dr. Cecília Maria Vieira Helm, Pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq.

Instituição" Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil.

Introdução"

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 assegurou aos indígenas os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Essas terras destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existente es.

Os povos indígenas que vivem, desde tempos imemoriais, na Bacia do rio Tibagi, no estado do Paraná, são os Kaingang (Je) e os Guarani (Tupi-Guarani).

Os documentos produzidos, nos últimos anos, pela Companhia Paranaense de Energia - COPEL, indicam que as populações indígenas e não indígenas, que ocupam áreas de terras localizadas na Bacia do rio Tibagi, irão ser afetadas por Usinas Hidreletricas projetadas pelo setor eletrico para o aproveitamento do potencial energetico do rio Tibagi,Pr.

"Recentemente, a COPEL (1994) fez a Reavaliação do Inventário da Bacia do rio Tibagi, levando em conta o meio ambiente. No seu entender, "um fator que não pode ser desprezado quando se trata do meio ambiente e a questão indígena". Para essa Empresa Estatal " a alternativa de redução do nível dos reservatórios nas áreas indígenas e, a consequente diminuição da área inundada, e outro aspecto que irá considerar". (COPEL, 1994, 15). Argumenta que "sob o ponto de vista ambiental, a alternativa sem superposição apresenta uma área inundada 36,5 Km2 menor, que a com superposição". E acrescenta "a área a ser inundada do Posto Indígena Apucarana e 29% menor, em relação ? alternativa a Unterior (e) não deverá haver relocação da população indígena" que habita uma área de terras mais afastada, em relação ?s margens dos rios. (COPEL,94,4). O documento não aborda a importfncia das matas ciliares, para os indígenas da Bacia do rio Tibagi.

Utiliza os estudos antropológicos de Cecília Helm e Kimiye Tommasino para analisar "as relações de trabalho e a economia nos Postos Indígenas".

O documento tem o merito de reconhecer que "a interferencia direta causada pelos reservatórios nas reservas indígenas, apesar de afetar áreas mais íngremes, de pouco cultivo e de difícil acesso, essas terras tem um valor simbólico muito significativo para os índios". Faz referencia "a prática da pesca artesanal,denominada pari, feita nas corredeiras do rio Tibagi." (COPEL,94, 23).

A partir de 1995 foram realizados estudos de viabilidade das duas pr áimeiras usinas, Jataizinho e Cebolão, previstas para serem construídas em 1999 e, colocadas em operação, no ano 2003.

A COPEL informa que optou por 7 possibilidades de aproveitamento do potencial energetico da Bacia do rio Tibagi, sendo que as UHs Cebolão, a de São Jerónimo e Mauá, se forem implantadas, irão atingir as Áreas Indígenas Barão de Antonina, São Jerónimo, Apucarana e Mocóca.

A justificativa da Companhia Paranaense de Energia, para a implantação de UHs na Bacia do rio Tibagi se fundamenta na necessidade de "atender ao consumo de energia no Paraná, em especial na região de Londrina".(COPEL, 1995).

Em um documento difundido pela COPEL (1995) está escrito que "uma pequena parte das terras do Posto Indígena Barão de Antonina será inundada devido ao enchimento do reservatório da Usina Cebolão". E com !plementa" "Esta questão será analisada no estudo de viabilidade".

O que a Empresa entende "por pequena parte das terras indígenas" não e explicitado. Tambem deixa de especificar se são terras agricultáveis, os lugares onde os indígenas armam os seus paris ou os locais onde enterram os seus mortos. Como sabemos, a terra representa para as sociedades indígenas o suporte da vida social e está ligada ao sistema de crenças e de valores.

História recente da ocupação da Bacia do rio Tibagi

Os territórios indígenas da Bacia do rio Tibagi foram invadidos pelos fazendeiros dos Campos Gerais do Paraná que estabeleceram pequenos núcleos de povoamento e passaram a ocupar as terras indígenas, em 1840. O mais notável foi o Barão d ;e Antonina que se apossou de grande extensão de terras e, mais tarde, "doou" aos índios estas mesmas terras. Tambem cedeu as terras de sua fazenda, que antes eram ocupadas pelos Kaingang chefiados pelo cacique Inhoó, para que o Governo do Imperio criasse o Aldeamento Indígena de São Jerónimo.

^Os Kaingang deslocados para esse aldeamento eram do grupo do cacique Manoel Aropquimbe, num total de 78 índios. De acordo com Wachowicz, "os Kaingang decidiram levar para São Jerónimo um grande número de membros de sua parentela que viviam nos campos e matas da região" (WACHOWICZ, 1987, 56). Tambem foram aldeados 112 Kaingang do grupo do cacique Caurú e 95 do cacique Gregório. r Em 1875, ocorreu a ocupação das terras do Aldeamento Indígena de São Jerónimo por não indígenas.

As tentativas de ocupação das terras indígenas dos campos de Inhoó, pelos brancos continuaram nas terras "doadas" aos Kaingang pelo Barão de Antonina. Os atritos entre os Kaingang e as populações brancas eram constantes na região desde o início do contato interetnico. > Nos primeiros anos da República as terras indígenas de São Jerónimo foram invadidas por grande número de famílias de posseiros. Para Wachowicz,"os posseiros do tempo da província transformaran-se em grileiros", os quais com base na lei provincial n§ 1114 de 1860 - que autorizava a venda de terrenos abandonados e que haviam pertencido ?s missões ou aldeamentos indígenas - começaram a negociar as terras dos índios.

Em 1920, o número de posse _iros em terras indígenas na Área de São Jerónimo era de 400 famílias. Alem desses, haviam os colonos instalados desde o seculo XIX com a autorização de Frei Cimitile, que foi diretor do aldeamento.

Levi-Strauss, em Tristes Trópicos, em suas descrições de viagem pelo interior do Paraná, no Tibagi, registra que "a reserva de São Jerónimo estendia-se por cerca de 100 mil hectares, povoados por 450 índios reunidos em cinco ou seis povoados 0...". Relatou que "os Caingangue cultivam um pouco a terra, mas a pesca, a caça e a coleta constituem suas ocupações essenciais".(LVI-STRAUSS, 1955, 1996, 146-148).

Na decada de 40, o governo do Paraná e o Ministerio da Agricultura resolveram fazer um Acordo, para reduzir a área dos territórios indígenas.

Em 1949, o Tribunal de Contas da União aprovou o Acordo inconstitucional entre a União e o Estado do Paraná, que reduziu as Áreas de terras dos índios Guarani e Kaingang, localizadas no sul do Brasil.

Os índios que ocupavam terras na Bacia do rio _Tibagi, desde tempos imemoriais, e que foram negociadas pelo Governo, neste seculo, foram expulsos e deslocados para espaços usufruídos por outros grupos Kaingang e Guarani. Suas áreas sofreram retaliações.

O Governo transformou as Áreas Indígenas em glebas, como ocorreu no sudoeste do estado do Paraná, com a Área de Mangueirinha (Posto Indígena Cacique Capanema) que foi dividida em 3 glebas, A,B e C, sendo que as duas extremidades do território original permaneceram com os índios Guarani e Kaingang e, a parte central, foi negociada e transferida para grupos de empresários madeireiros.

Os grupos indígenas localizados em São Jerónimo, no Tibagi, ao norte do estado do Paraná, ficaram com apenas 14% da área original da Fazenda São Jerónimo, de todo o território que ocupavam desde tempos imemoriais. Seu antigo território foi drasticamente reduzido a duas glebas de terras, não contínuas, no município de São Jerónimo" a de São Jerónimo e a Barão de Antoni _na que formavam o Posto Indígena Barão de Antonina.

Em 1953, o Governo do Paraná mandou que fossem medidas as terras dos índios de São Jerónimo. Para os Kaingang e Guarani e, para o órgão que detem a tutela, o SPI-FUNAI começava nova luta política" a de expulsar os invasores que estavam instalados em suas terras.

Nos anos 70 e, em 1985, houve significativa mobilização indígena nas Áreas São Jerónimo e Barão de Antonina. O objetivo era expulsar os posseiros das terras indígenas.

O movimento indígena que eclodiu na America Latina e no Mexico, na decada de 1970, ocorreu no Brasil e se extendeu tambem para os estados do sul.

As organizações políticas indígenas representaram uma nova etapa, para esses povos que vem recorrendo a várias formas de resistencia, para preservar sua cultura e identidade enfrentando lutas com os brancos, para defesa de seus territórios. (HELM, 1987, 57).

As Áreas Indígenas Barão de Antonina e São Jerón `imo'PR A AI Barão de Antonina está situada no município de São Jerónimo da Serra, no estado do Paraná, junto do rio Tibagi no terceiro planalto, numa altitude de 920 m e a uma distfncia de 314 km de Curitiba, Capital do Estado.

Na Bacia do rio Tibagi estão localizadas as Áreas Indígenas Barão de Antonina, São Jerónimo, Apucarana, Tibagi Mocóca e Queimadas.

AI Barrão de Antonina tem 3.759,7220 ha. Estão aldeados nessa área 375 índios Kaingang e 5 Guarani. São 76 famílias indígenas.

A chefia do Posto está sendo exercida por um Kaingang, de nome Luiz Alan Juvencio. O Posto possui sete funcionários, duas escolas, duas enfermarias e veículos. Há tambem duas professoras mantidas pela FUNAI e um auxiliar de enfermagem. O cacique da Área e o índio Kaingang Lasmo Rael.

A Área e constituída por duas aldeias" Pedrinhas e Cedro. A sede do Posto está localizada na aldeia Pedrinhas. Há energia eletrica instalada nesta aldeia. Na aldeia Cedro está ed Sificada a Igreja da comunidade que e da religião católica. Há o salão de festas, a escola e a cadeia.

Na aldeia Pedrinhas está edificada a escola Cacique Onofre Kanhgrem e, no Cedro, a escola Raul Vynhkag. Nas escolas, o ensino de primeiro grau e ministrado da primeira ate a quarta serie. Há um monitor bilínge que alfabetiza os alunos na língua Kaingang.

A Área Barão de Antonina tem as suas divisas delimitadas por rios. A oeste o Tibagi, ao sul o rio do Tigre, a sudeste o córrego do Bebado, ao norte pelo ribeirão do Pinhal. No interior dessa Área passa o ribeirão Água Branca. Há outros córregos menores que vão desaguar nos rios Tibagi e Tigre.

O Esses recursos hídricos são utilizados pela população indígena de várias formas. Costumam pescar e caçar pequenos animais. A pesca e praticada com pari, armadilha tradicional usada pelos indígenas ate os dias de hoje, na Bacia do Tibagi. Tambem pescam utilizando anzóis, tarrafas e redes.

Junto com os rios e os pequenos cursos de água, as matas ciliares e das encostas dos rios Tibagi e Tigre abrigam animais e aves. A fauna e a flora tambem fazem parte do universo mítico dos indígenas. Por toda a extensão das matas há trilhas, nas quais circulam os índios, desde a sede do Posto, na parte alta, ate as barrancas dos rios.

Os campos estão localizados nas partes altas e foram transformados em áreas de plantio e de pastagens para o gado. Cultivam mandioca, feijão, milho, arroz, abóbora e soja. No entremeio das pastagens há uma grande variedade de frutas silvestres muito apreciadas pelos indígenas.

Os índios dessa Área praticam a agricultura, confeccionam arte ½sanatos, criam animais e complementam a renda familiar, trabalhando como diaristas em fazendas da região.

Ainda saem para trabalhar em usinas de cana-de-açúcar localizadas no estado do Mato Grosso. São levados pelos empreiteiros que tratam os serviços com o cacique e o chefe do posto, contratando os índios para o trabalho temporário.

Em nossas pesquisas entre os índios do Paraná, na decada de 70, (HELM 1974, 122) constatamos uma situação de conflito intenso, no Cedro e nas Pedrinhas, na AI Barão de Antonina. A Área estava ocupada por intrusos que se auto-denominavam "posseiros" e usufruiam as melhores terras no Cedro. Os Kaingang faziam suas roças em uma pequena ñe acidentada parte do seu território.

Tambem foi registrado que os índios iniciaram um movimento para a expulsão dos intrusos de suas terras, no final de 1970. Nesse período utilizavam 30% da área, o restante estava ocupado por brancos. Diante de um conflito armado entre índios e "posseiros" a FUNAI com o auxílio da Polícia Militar conseguiu expulsar os intrusos da Água Branca. A área restante, ou seja, o Cedro, foi desocupada em 1985 (Folha de Londrina, 15'05'1985). Cansados de negociar com a FUNAI, INCRA e ITCF, os índios decidiram adotar outras estrategias. Aprisionaram alguns funcionários desses órgãos como refens. Os índios redigiram um documento exigindo a reintegração de posse da área do Cedro e a retirada imediata dos "posseiros". Tais medidas contribuíram para que os "posseiros" fossem expulsos dessa Área Indígena. Com a retirada dos posseiros os índios voltaram a ocupar as terras intrusadas, construindo moradias e planta Ðndo roças.

Outro episódio ocorrido no mes de janeiro de 1996 (Folha de Londrina, 16.01.96) na AI Barão de Antonina foi a invasão de 60 agricultores e colonos do distrito de Pinhal, no município de São Jerónimo, que entraram na Área e permaneceram durante 4 dias acampados com enxadas e foices. Os índios pintados para a guerra acamparam nas proximidades das barracas dos invasores. De acordo com a imprensa local e informações obtidas junto a Inspetoria Regional da Fundação Nacional do Öndio - FUNAI de Londrina, 150 Kaingang da Área Apucarana, 80 da Área Marrecas (Guarapuava) e 25 de Laranjinha (Santa Amelia) se deslocaram, para auxiliar os índios dessa Área para expulsar os invasores. De acordo com os tecnicos da FUNAI, o contingente invasor era constituído pelos mesmos indivíduos que foram indenizados para deixar a Área em 1985.

No mes de maio, novas invasões de posseiros geraram tensão na Área Indígena Barão de Antonina. (Gazeta do Povo, 23.5.96, 13). Durante o ano de 1996 ocorreram quatro einvasões nessa Área. (Folha de Londrina 18.12.96).

Na AI Barão de Antonina existe um Conselho Indígena que toma decisões e estabelece as relações entre os membros dessa comunidade, com os regionais e órgãos governamentais. Este Conselho e formado pelo cacique, o vice cacique, lideranças jovens e alguns membros mais velhos que tomam decisões nas reuniões.

Há tambem o Conselho Indígena do Norte do Paraná que e formado pelos caciques das Áreas que compõem a região. Jose Maria Rodrigues, índio Kaingang, era o Presidente desse Conselho e foi substituído recentemente pelo índio Lourival de Oliveira.

No Posto Indígena Barão de Antonina há tres índios ocupando funções de destaque" um Kaingang e o chefe do Posto, uma Kaingang atua como professora bilínge e uma terceira, da etnia Guarani, tambem e professora bilínge. Todos residem na Área Indígena.

A AI São Jerónimo está situada nas proximidades da Q cidade denominada São Jerónimo da Serra, no Norte do Estado do Paraná. Localizada na Bacia do rio Tibagi, na margem esquerda, encaixada no vale do rio do Tigre e banhada a Oeste e ao Sul pelo ribeirão dos Pilões.

Esta Área e habitada por 300 índios que pertencem ?s etnias Guarani e Kaingang. Há tambem um índio Xetá de nome Ticuen, casado com uma Kaingang. Ocorre miscigenação entre índios e brancos e alguns casos entre Guarani e Kaingang. Tem 1.342,62 ha e foi demarcada, atraves do Decreto Federal 286 de 29'01'91. O Posto Indígena tem nove funcionários, uma enfermaria, uma escola, um rádio e um veículo. Na enfermaria prestam serviço um enfermeiro e um auxiliar índio.

A escola possui um monitor bilíngue, tres professoras, sendo duas contratadas pela Prefeitura de São Jerónimo da Serra e uma pela FUNAI. Há um monitor Kaingang responsável % pela alfabetização bilínge. A partir da 5¦ serie os estudantes passam a freqentar as escolas públicas das cidades vizinhas. Menos de 10% dos jovens prosseguem seus estudos. Poucos indivíduos falam a língua Kaingang. A maioria se comunica em portugues. As casas ocupadas pelos índios são de madeira. Há ainda ranchos de tábuas e de troncos.

O ambiente natural está descaracterizado, com exceção das encostas adjacentes ao salto formado pelo rio do Tigre, onde a floresta primária foi pouco alterada. A maior parte da Área e ocupada por roças. Há matas secundárias e capoeiras. Ocorre a extração de madeiras realizada por não índios. Na Área Indígena existem ainda aves e mamíferos, cuja caça complementa a dieta alimentar dos indígenas.

Os índios de São Jerónimo sobrevivem de suas roças de subsiste kncia e trabalham nas propriedades vizinhas, como diaristas.

Usina Hidreletrica Cebolão

A COPEL reali gzou, em 1995, os estudos de viabilidade das UHs Jataizinho e Cebolão na bacia do rio Tibagi, para abrir concorrencia pública para a elaboração do EIA-RIMA. De acordo com seus tecnicos "o estudo de viabilidade serve para definir melhor o projeto da Usina".

Em 1996, divulgou "que os estudos tecnicos de impacto ambiental e de pre-viabilidade tecnica e econónima, para a construção das usinas hidreletricas Cebolão e Jataizinho no rio Tibagi" haviam sido realizados pelo Consórcio Intertechne-Leme-Engevix-Esteio, contratado pela Empresa, em 1995, para fazer o levantamento. Informou que o início da obra está previsto para fins de 1999, tanto em Jataizinho como em Cebolão e que a operação está programada para o ano 2003. Justificou que as duas usinas "são estrategicas para a região de Londrina e representam 10% a mais de energia com um mínimo de impacto ambiental". à Cebolão terá uma potencia instalada de 168 MW e Jataizinho 155 MW. A primeira irá inundar 1.800 ha. e a de Jataizinho, 2.240 ha.

A Usina Cebolão deverá ser instalada a cerca de 35 km rio acima da ponte na estrada que liga a cidade de Jataizinho a Ibiporã. Foi projetada para abranger uma área de 25,7 km2 (1070 alqueires).

De acordo com a COPEL (1996) "o nível de impacto ambiental será praticamente nulo,uma vez que as terras alagadas perderam sua cobertura original há muito tempo". (Folha de Londrina, 01.12.96, 12).

A Usina Cebolão deverá atingir os Guarani e os Kaingang das Áreas Barão de Antonina e São Jerónimo. As roças, os pomares, as hortas, as matas ciliares, a pesca tradicional com pari,os rios vão ser afetados pela UH Cebolão ·a ser construída na Bacia do Tibagi. Os recursos naturais serão alterados. As relações sociais passarão por um processo de mudança. As condutas dos indígenas face aos impactos da Usina serão distintas. A cultura do contato deverá ser atualizada.

Os indígenas de São Jerónimo localizados a uma distfncia maior da barragem tambem estão dentro da área de influencia da obra.

As relações de parentesco, os laços comunitários, ajuda mútua, compadrio, amizades que os indígenas tem entre os membros das duas Áreas irão se alterar.

Como foi descrito, os indígenas habitam desde tempos imemoriais esse território, cujas terras tem sido alvo de atritos entre índios e regionais.

Durante decadas enfrentaram a presença de invasores em seu território. Organizaram-se políticamente e, no final dos anos 70, com a ajuda dos Kaingang e Guarani de outras áreas conseguiram expulsar uma parte dos posseiros que exploravam suas terras e mão-de-obra.

Em 1985, 1995 e 1996 ocorreram n úovos conflitos ate a expulsão definitiva dos invasores da área do Cedro. No momento, estão ocupando todos os espaços de seu território e possuem o controle da Área.

A construção da Usina Cebolão, a consequente perda de parte do território, das matas ciliares e as alterações em suas relações sociais irão significar novas mudanças para esses povos, notadamente os Kaingang, que tem enfrentado relações de contato conflitivas com os "brancos".

Representações e estrategias dos Indígenas.

Os indígenas que entrevistamos, na Área Barão de Antonina, estão incredulos com a notícia de que poderão ocorrer novos problemas, a serem enfrentados por eles, como a ameaça da perda de parte do território e matas. Disseram que "e dificil acreditar que um Projeto do Governo do Estado - da COPEL- coloque em risco novamente nosso território e maneira de viver".

Luis Alan Juvencio, chefe do Posto, e filho de um Kaingang que tambem foi lider no passado. Explicou que "tem uma forte preocup "ação com o ambiente. O alagamento de nossas terras e uma questão preocupante e isto não pode ser bom para nós. A Reserva, cada pedaço de nosso território e de grande importfncia".

Os indígenas manifestaram preocupação quanto ao alagamento das matas ciliares e terras situadas na beira dos rios.

Para Jose Maria Rodrigues, o Tapexi, que era Presidente do Conselho Indígena Regional do Norte do Paraná "a beira do rio Tibagi tem um valor maior para índios que a terra na beira da rodovia". (RODRIGUES, J. Maria, 1995).

Tapexi disse que o rio Tibagi e importante para a dieta alimentar dos índios. Deu explicações sobre a pesca tradicional com pari que confeccionam usando a taquara coletada na mata e que serve para aprisionar os peixes em barragem com pedras. "Se isso acabar com o progresso... o que sobra para nós..." Contou que vários índios passam meses na beira do Tibagi, em ranchos temporários, caçando e pescando com o auxílio dos paris.

Com a construção da UH Cebolã _o, o Tibagi deixará de ser um rio de águas turbulentas com sucessivas cachoeiras e corredeiras e irá se transformar em um rio lento.

No livro de leitura usado nas Escolas Indígenas do Norte do Paraná, a pesca com pari e descrita como uma das maneiras de os índios apanharem peixes. Para construir o pari o índio faz "duas carreiras de pedra, como uma barragem, na corredeira do rio formando um funil. Na ponta do funil coloca dois paus para segurar uma esteira de taquara. Os peixes descem o rio e entram na barragem de pedra e ficam presos na esteira. Aí os índios pescadores pegam os peixes com as mãos. Esta maneira e usada principalmente no inverno e nos periodos de seca".(RODRIGUES e TAPEXI, 1989).

Em "Pãri" armadilha de pesca utilizada pelos índios Kaingang no Sul do Brasil", MOTA, NOELLI e SILVA, 1995 definem os paris como "armadilhas constituídas por paredes de pedra feitas para afunilar trechos de rio, a modo de barragens, conduzindo os peixes ao apr 'isionamento em artefatos de taquara, bambu ou madeira".

Informam que os Guarani e os Kaingang denominan este tipo de armadilha de pesca" pari. Fazem uma análise das fontes históricas que descrevem a pesca com pari entre os índios na America Meridional e argumentam que os paris tem funcionalidade e são fáceis de serem construídos, porque "todo o material utilizado pode ser encontrado no próprio leito do rio (pedras) e em suas margens, como as taquaras dos cestos, cipós e embiras para sua amarração e madeiras para sua sustentação".

A pesca com pari foi descrita em 1859 pelo diretor da Colonia Militar do Jataí, Major Muniz" "pary e uma especie de curral artificiosamente feito em lugar onde as águas dos rios se precipitam, de sorte que, introduzidos pela violencia d;agua nelle os peixes reclusos ficam sem mais poderem sahir." Tambem TOMMASINO (1995) chamou a atenção para o fato de que a pesca com pari ainda e utilizada pelos Kaingang na Bacia do rio Tibagi.

O Projeto da C úOPEL para a Bacia do rio Tibagi irá atingir terras, matas, rios, onde se localizam índios e não índios, como colonos, arrendatários, meeiros e pequenos agricultores que devem apresentar reações distintas sobre a eventual perda do território, bens simbólicos.

Sobre a possibilidade de uma parte da Área Barão de Antonina ficar submersa e ser alterado o curso dos rios e quedas os índios (em 1995) disseram" "se isto acontecer, ficará uma grande saudade do rio e da mata e de tudo que o índio gosta".

SIGAUD, L. (1995) realizou um estudo sobre as condutas distintas dos camponeses, face ao deslocamento compulsório, devido a construção da barragem de Sobradinho. Ainda que os casos analisados por Sigaud sejam diferentes da situação encontrada na Área Indígena Barão de Antonina, Pr. foi possível registrar em termos comparativos um NÃO aos projetos externos e que possam ser implantados e causar grandes prejuízos ao meio ambiente e ? população.

Aqueles índios da Área que mantem mais avivad ba a tradição de acampar junto aos rios, para desenvolver atividades de coleta, pesca e caça se mostraram descrentes sobre a notícia do alagamento.

Os que habitam permanentemente as partes altas tambem expressaram sua contrariedade ? intervenção em seu território. Porem sua conduta durante as reuniões revelou um interesse maior em obter informações sobre seus direitos assegurados na Constituição Federal e como deveriam agir, se as Usinas vierem a ser implantadas.

Abandonar a beira do rio, a pesca com pari, imaginar que as cachoeiras serão trocadas por um grande lago, causa nostalgia aos índios e preocupação para suas lideranças.

Manifestaram interesse em realizar reuniões com os indígenas das Áreas de Mangueirinha e Ocoí, Pr. afetados na decada de 70 pelas Usinas Hidreletricas Salto Santiago e ITAIPU-Binacional para trocar informações sobre os proce -dimentos adotados pelas Empresas" saber se foram respeitados os Direitos Indígenas e recompensados devidamente pela inundação de parte de seus territórios.

Não acreditam que os impactos sejam "praticamente nulos", como propaga a COPEL. Por outro lado, a Empresa está empenhada em despertar nos índios interesse pelo Projeto.

Quais estrategias políticas irão adotar, quanto ? eventual inundação de suas terras e matas ciliares e tema de suas reuniões e encontros. Se devem resistir ou participar das decisões sobre a implantação das usinas hidreletricas na Bacia do rio Tibagi e, negociar com o governo, possíveis compensações pelos prejuízos causados em seus territórios e organização social são preocupações que vivenciam os indígenas e suas lideranças.

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