From: "Mauro Cherobim" To: "Lista ANT-ARQ" Subject: (ANT-ARQ) Re: globalizacao Date sent: Sat, 24 Oct 1998 23:02:53 -0200 Send reply to: "Mauro Cherobim" Quero aproveitar para responder, ao mesmo tempo, para Karollina e Diego. Estas discussoes são enriquecedoras e é claro que quando escrevemos um trabalho a nossa percepcao se estreita demais em nosso objeto de analise. São as discussoes, portanto, que nos fazem perceber nossos "impercebidos". Com referencia com a relacao da expansao maritima com a globalizacao, há um artigo muito interessante de Carlos Guilherme Mota publicado no O Estado de São Paulo falando a respeito disto. E é por isto que costumo dizer - claro que como antropologo - que existe uma relacao muito proxima entre lobalizacao e definicao de mundo. Intermediando estas duas nocoes estao as comunicacoes. O tamanho de mundo não é, portanto, seu tamanho fisico mas os limites de nosso conhecimento. Fui radiotelegrafista e foi esta profissao que "financiou" meus estudos. Quando "troquei de profissao", de radiotelegrafista para antropologo, eu me senti preso a estreitos limites geograficos, uma especie de "claustrofobia social". Como telegrafista tinha amigos em muitos pontos distantes, conhecia-os pelo manipular o codigo morse e conversavamos (e tambem brigavamos) burlando as proibicoes de se usar os equipamentos radiotelegraficos somente para trabalho. A troca de atividades me levou ao radioamadorismo e assim voltei a "quebrar" os limites geograficos. E fui alem pois meus contatos comecaram a ser mundo a fora. "Meu mundo", então, excedia aos limites geográficos aos que eu vivia (fisicamente). Isto faz me lembrar Cooley que, ao definir contato primario (ou grupo primário) ressaltava como fator primoridial as relacoes "frente-a-frente" ( ou "cara-a-cara"). Com o desenvolvimento das comunicacoes verificou-se que o "grupo intimo", como definia Colley, não necessitava destas relacoes "cara-a-cara" e que podeiam ser mediadas por equipamentos de comunicacoes: rádio, telefone e agora os computadores conectados na Internet. Lembra-se do filme Barbarela, para mim uma representacao bem humorada da Cidade de Deus de Santo Agostinho? Outro dia li um outro bem humorado artigo acerca de uma "transa" com os parceiros "plugados" na Internet. Uma ficcao bem humorada neste momento, mas continuará sendo dentro de pouco tempo? Ou estas discussoes que fazemos aqui, trocando ideias, cada um em "seu canto". Esta, parece-me, é a parte palpável da mundializacao. Mas quando tudo isto nos alcança repentinamente, como um turbilhao, ficamos perdidos mas aos poucos vamos "encontrando nossos caminhos". Quando comecamos a ter acesso ao computador pessoas, estive entre os primeiros cientistas sociais a utiliza-lo. Havia o medo de as maquinas nos dominarem. A novidade hoje é alguem ter uma maquina de escrever. Uma "novidade antiga". Ao trocarmos estas idéias chegamos ate a esquecer que fazemos intermediados pelo pessoal da Naya. Como eu operava em radiotelegrafia, diziam-me que isto era uma coisa chata, igual para todo mundo e no mundo todo. Uma "perda de identidade"? Os nao telegrafistas nao conseguiam encontrar um identificador para cada operador, independentemente do pais que pertencesse. Mas havia. A primeira identidade, sempre presente, é a identidade de nacionalidade: cada radioamador é identificado por um indicativo composto de um prefixo que identifica o país e a regiao do país (PY1, Brasil e Rio de Janeiro; PY2, Brasil e São Paulo; LU1, Argentina e Buenos Aires, e assim por diante). No decorrer dos contatos cada radioamador ia deixando claro seus elementos identificadores. Depois havia a forma de cada um transmitir seus sinais morse, como se fosse uma forma de se falar. Depois o caráter de cada povo, identificado por questões políticas de seus paises, culturais, etc. Entao a coisa comeca a deixar de ser chata porque todos eram diferentes, cada qual se identificando e identificando suas sociedades de origem. Acho que a partir daqui ficará mais claro para expor minhas idéias para Diego. Faço isto referindo-me aos guarani do litoral paulista. Ali há dois subgrupos: os Mbüá (ou Mbyá) e os Ñandeva. Os primeiros chegaram ao litoral depois dos Ñandeva, mudavam muito de aldeamento e viajavam sempre entre os Estados do Espirito Santo e Rio Grande do Sul. Também realizavam muitas expedicoes comerciais nas cidades do litoral e na capital São Paulo. Tinham uma forte consciencia étnica em razão de estarem sempre envolvidos por representantes da sociedade nacional, repelindo qualquer relacionamento além dos comerciais. Os Ñandeva, por outro lado, tornaram-se sedentários. Ficaram amigos de seus vizinhos nacionais que iam na aldeia jogar futebol, tomar cachaça, participar de mutiroes (trabalhos comunitarios). A partir de um determinado momento comecaram os casamentos mistos e as igrejas pentecostais a aparecer para realizar seus proselitismos junto aos indios (a questao destas igrejas vai mais longe...). O que aconteceu a partir de um determinado momento? Surgiu um sentimento que estavam deixando ser indios, e os vizinhos nacionais não deixavam de os consider indios. As igrejas faziam o mesmo porque se tivessem indios entre seus membros adquiriam status de missionarias e assim tinham uma maior participacao na distribuicao de verbas de suas sedes. Este processo desorganizatorio deu inicio ao que se costuma chamar de reacao contra-aculturativa. Quiseram a voltar a ser indios como eram antigamente. Foi necessario, para isto, "reconstruir" o que entendiam ser sua cultura original. O cerimonial religioso em suas casas de rezas, por exemplo, mais pareciam um cerimonial de umbanda (religiao afro-brasileira). O rezador dizia, até, que eles pertenciam à "linha guarani", uma oitava linha alem daquelas sete ditas pelos umbandistas. Este fato lembra à proibicao das antenas parabolicas no Iran e no Afaganistao. As identidades se apresentam opositivamente e suas relacoes são chamadas por alguns autores como contrastivas. "Nossa" identidade se apresenta através de identificadores que "dizem" quem e como somos. Se por um lado a globalizacao tende a hogeneizar as sociedades, os membros destas sociedades procuram reforçar suas identificacoes para evitar um processo desorganizatorio. É claro que os participantes (pessoas, grupos, etc.) absorvem elementos culturais de outras sociedades, mas os reformulam para suas experiências culturais. Um exemplo destes tipos de reformulacoes foi o tema de um comentário, publicado num jornal, a respeito da expressao "disk", muito utilizado em vendas por telefone. Utilizamos o verbo discar no sentido de girar o disco do telefone para estabelecer uma ligação. Resolvemos anglicizar esta expressao. Então, ao invés de dizer "disque pizza" passamos a dizer "disk pizza", e assim por diante. Dizia o comentarista, um norte-americano radicado aqui em São Paulo, que o americano nunca entenderia isto pois, "disk" para eles é disco e telefonar é "dial". Para eles seria "dial pizza" pois o nosso discar para eles é "dial". Este é um exemplo que me vem à mente, no momento, de reformulaçao de um elemento cultural. Eu acho, diego, que de certo ponto globalizacao e pobreza são fenomenos distintos se considerarmos a globalizacao como intensidade de informacoes, os focos de pobreza, problemas de ecologia, etc., se tornaram mais evidentes, permitindo-se criar consciencias e desenvolver blocos de pressao para sua resolucao. Isto estaria entre as "n" vantagens da Internet. Ainda hojen existem pessoas que nao acreditam na ida do homem à lua. As mudanças nao chegam para todo mundo. Da mesma forma as novas tecnologias. Quantos intelectuais existem, ainda hoje, que escrevem seus rascunhos manuscritamente e a lápis. Depois entregam seus garranchos às suas secretárias. Tenhos dois amigos que fazem isto. Um deles já usa caneta esferografica!... Deve ser um percentual pequeno, em relacao à populacao, o numero de pessoas que se utilizam de computadores. Destes, uma parcela pequena está conectada à Internet. O mesmo podemos dizer com relacao ao telefone, ao automovel, ao telefone celular e outros equipamentos modernos que o identificamos como "indispensaveis". E já está chegando o telefone de Iridium as coneccoes à distancias e as internacionais como locais. É provável que daqui a pouco esta nossa Internet estará absoleta. Já há um provedor em Curitiba, em que a comunicacao com seus usuários é feita via rádio, com um apreciavel aumento a velocidade das comunicacoes. O acesso a tudo isto é possível, inicialmente, a um pequeno grupos de pessoas Os chamados de felizardos (financeiramente falando) ou de fanaticos. Nós, pessoas comuns, temos que esperar os preços baixarem para fazer nossos updates e vamos vendendo nossos equipamentes "ultrapassados" para pessoas de menores posses. Este é o processo. Certo, errado, bom, ruim? Para mim é como as coisas acontecem. Peço desculpas por ter me estendido muito. Estarei à disposicao para esclarecer o que nao ficou claro. Agradeco (e agradecerei) as criticas. ============================== Mauro Cherobim Antropólogo - Professor Sao Paulo - Brasil Tel./Fax 55 011 6991-7956 mcherobim@sti.com.br mcherobim@prof.ung.br cherobim@marilia.unesp.br =============================== -----Mensagem original----- De: Diego Braude Para: Mauro Cherobim Data: Sexta-feira, 23 de Outubro de 1998 13:41 Assunto: Re: globalizacao >Mauro Cherobim wrote: > >> Tenho acompanhado na medida do possivel a discussao acerca da >> globalizacao. A globalizacao que se discute aqui é esta ao nosso >> alcance intermediada por computadores... > >Te quería hacer una pregunta con respecto a tu comentario sobre la >globalización, específicamente sobre el cuarto punto. ¿En qué sentido >dirías que la globalización, y me refiero sólo al aspecto de las >comunicaciones, refuerza las identidades? ¿No se produce, aunque sea >lentamente, una mistura cultural? (Por ejemplo, la introducción más >masiva, vía internet, de la cultura chamánica en, digamos, Estados >Unidos). > >Por otra parte, ¿no te parece que es un poco falso hablar de >globalización cuando la mayor parte de los habitantes del planeta vive en >la pobreza? ¿No es acaso globalización, pero sólo a determinado nivel >socio-económico? > >Agradecería enormemente tu respuesta > > Diego Braude >Estudiante de Ciencias Políticas >Estudiante de Artes >Escritor y Fotógrafo >mail: jbraude@impsat1.com.ar > ======================================= Engraçado fiz um trabalho faz pouco tempo a respeito dessa progressiva globalização que se iniciou com Expansão marítima. Sim concordo plenamente sobre a NOVA REVOLUÇÃO nos meios de comunicação. E como havia dito no primeiro e-mail, há "n" vantagens. Foi ótimo eu ter escrito aquele e-mail. Vi alguns pontos que antes não havia percebido! Ah! Meu nome é Karollina mesmo, e não Carolina! : ) Karollina Freitas Rio de Janeiro, RJ Brasil "O futuro está em nossas mãos!" ************************************************************ arqueologia.karoll@zipmail.com.br lilica@infolink.com.br ICQ: 16913758 § Arqueologia World § www.infolink.com.br/~arqueologiaworld/index.html ************************************************************